quinta-feira, 22 de abril de 2010

Arquitetura sustentável na prática


Leiko Motomura coordena a Amima, um escritório de arquitetura que trabalha com soluções que gerem o mínimo impacto sobre o meio ambiente. Ela concedeu a seguinte entrevista para este blog:


Flávia Albo: Quando você começou a trabalhar com este tema, havia algum tipo de resistência das pessoas com a arquitetura sustentável?


Leiko Motomura: Não posso dizer que encontrei resistência porque ao entrar em contato com estas idéias em 1985 quando fui a um Congresso de Arquitetura Solar Passiva em Munich, fiquei tão admirada, que o meu inicio foi abraçar a causa, simplesmente relatar entusiasmada e não convencendo os clientes. Saí à procura de mais informação. Fui a Cuba num Congresso de Ecomateriais e à Colômbia aprender sobre bambus. Depois disto, as pessoas que me ouviam falar, automaticamente se entusiasmavam e se engajavam, permitindo que eu aplicasse os conhecimentos adquiridos.
Hoje em dia, com alguma divulgação sobre os trabalhos realizados, todas as pessoas que me procuram, vem pela forma como trabalhamos.


FA: Como a Amima costuma trabalhar?


LM: O ideal é participar desde a escolha do terreno porque a observação da implantação e insolação são muito importantes para se tirar proveito do sol, aliado fundamental para a eficiência energética de uma construção. Mas nem sempre o cliente nos procura nesta fase porque não imaginam que isto seja importante. Ultimamente temos tido clientes que pedem nossa opinião ao escolherem o terreno, pois já conhecem a maneira como trabalhamos.
Após esta fase, na fase do projeto, a escolha dos materiais é importante, mas não fundamental para a economia de energia. A grande parte da energia gasta num edifício é durante o seu uso e não na fase de produção dos materiais. Sendo assim, a preocupação com o “envelope” do edifício - proteger e isolar do frio e calor, deixando entrar o sol quando preciso, ventilando e iluminando naturalmente – têm um impacto muito maior na economia de energia elétrica. Mas a escolha de equipamentos eficientes (elevadores, ar condicionados, máquinas, bombas, luminárias etc) e projetos complementares eficientes ajudam no todo.


No trato com a água, devemos utilizar metais e louças econômicas. Além disso, o reuso das águas servidas e não só o das chuvas é um item importante a ser considerado.
Quanto aos materiais, a análise de sua composição e produção previne contra o mau uso da matéria-prima e energia para produção, ao mesmo tempo que melhora a qualidade do ar interno ao descartar componentes tóxicos. Às vezes, os sintomas desta má qualidade não chegam a ser uma “doença”, mas aquele mal-estar (vista coçando, nariz escorrendo, alergias, dores de cabeça, etc) que nenhum médico diagnostica como doença, mas é um estado crônico causado por vernizes, colas, materiais sintéticos em carpetes, estofados, tintas etc.


Para completarmos a eficiência, a execução da obra por uma construtora ou empreiteira consciente é fundamental porque uma parte considerável da poluição e lixo que uma construção gera, é durante a obra.
Ter um time afinado tanto nos projetos como na construção, é fundamental.


FA: Em uma grande cidade como São Paulo, quais os grandes desafios de sustentabilidade na arquitetura e construção?


LM: Em primeiro lugar, a dificuldade é fazer com que as pessoas raciocinem no longo prazo, pois não se pode fazer uma decisão pensando somente no hoje/agora.
Na cadeia da construção, todos os projetistas devem estar alinhados (estrutura, hidráulica, elétrica, mecânica etc). As escolas devem estar formando profissionais com estes valores. Nem todas elas estão preocupadas...
As lojas de materiais de construção devem se conscientizar e procurar fornecedores igualmente conscientes. Hoje em dia, é muito difícil achar os “bons materiais”. A pesquisa que temos que fazer é muito grande.
A indústria de materiais por sua vez, tem que se preparar com dados sobre os seus produtos, pois se vamos escolhê-los conforme seu desempenho as informações devem estar disponíveis. Muito poucas têm.
Numa cidade como São Paulo, os problemas são tão potencializados que muitas decisões deveriam vir já com força de lei, para todos cumprirem sem ter que esperar pela conscientização individual gradativa. Na Alemanha, por exemplo, há bons exemplos sendo implantados.
Poderia haver também maior ligação entre as ações de urbanização com os edifícios construídos, pois, mais uma vez, a integração e o estudo conjunto são chaves para a maior eficiência num sentido mais amplo que englobe transporte, setorização e formas de uso das cidades.

Nenhum comentário:

Postar um comentário